A Defensoria Pública de SP obteve uma decisão judicial que permite a alteração do nome de uma criança registrada pelo pai, com o nome diferente do que havia sido combinado com a mãe. No caso, o pai registrou a filha com o nome do anticoncepcional que a mulher tomava quando ficou grávida.
O pai da criança, que não participou dos meses de gestação por achar que Ana (nome fictício) havia planejado, propositadamente, a gravidez, registrou a filha com o nome do remédio anticoncepcional – e não com aquele que ambos haviam concordado em dar para a criança.
Inicialmente, Ana tentou fazer a alteração do nome no cartório de registro. Com a negativa, decidiu ingressar com uma ação judicial, “a fim de evitar que a criança possa saber os motivos pelo qual seu pai deu a ela o nome do remédio, e passe por situações vexatórias”.
O pedido foi negado em primeira e em segunda instância, quando então a Defensoria Pública levou o caso ao Superior Tribunal de Justiça (STJ).
No recurso, buscou-se apontar que houve vício no processo de escolha do nome, com desrespeito ao pactuado entre os pais da criança, além de ter havido também violação da boa-fé objetiva por parte do pai – o que basta para que a alteração do nome seja permitida.
O Defensor Público Rafael Rocha Paiva Cruz, responsável pelo caso, apontou que o pedido de Ana tem respaldo na Constituição Federal, na Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/1973), no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que garantem proteção legal contra ameaça ou lesão a direitos de personalidade; direto ao nome, incluindo prenome e sobrenome; proteção do nome contra desprezo público, proteção aos direitos fundamentais das crianças, com absoluta prioridade; e respeito à dignidade e preservação da imagem e identidade das crianças.
“É certo que o pai também tem o direito de participar da escolha do nome da filha. Contudo, (…) jamais poderia afirmar concordar com o nome, comprometer-se a ir ao cartório realizar o registro nos termos combinados e, diversamente, indicar outro nome. (…) O vexame não se atém à mãe, também se transfere à criança, que carregou em sua identificação, em sua personalidade, o nome do anticoncepcional e a marca de que sua concepção não era desejada pelo pai, tendo sido utilizada como objeto de violação pelo pai à própria mãe”. No julgamento, após sustentação oral realizada pela Defensora Pública Fernanda Maria de Lucena Bussinger, do Núcleo de Segunda Instância e Tribunais Superiores da Defensoria, os Ministros da 3ª Turma do STJ, em votação unânime, concordaram que houve rompimento unilateral do acordo prévio realizado entre os pais da criança. “Trata-se de ato que violou o dever de lealdade familiar e o dever de boa-fé objetiva e que, por isso mesmo, não deve merecer guarida pelo ordenamento jurídico, na medida em que a conduta do pai configurou exercício abusivo do direito de nomear a criança”. Dessa forma, consideraram que há motivação suficiente para autorizar a modificação do nome da criança, tal como permitido pela Lei de Registros Públicos.
O Defensor Público Rafael Rocha Paiva Cruz ressaltou a importância desta decisão: “A decisão permite que casos semelhantes sejam revisados, uma vez que é comum o pai registrar o filho com nome diferente do combinado com a mãe da criança, como uma homenagem a um ídolo de futebol, por exemplo. Nesse sentido, essa decisão traz uma inovação muito importante”.
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